A Morte como Simbolismo de Transformação e Mudança: Em Busca de Renovação, Mudança e Crescimento

A morte é um tema carregado de significado e emoção para todos nós. Quando pensamos na morte, geralmente associamos esse conceito ao fim da vida física, ao luto, à finitude e à tristeza. No entanto, a morte também pode ser vista como um poderoso símbolo de transformação e mudança, capaz de nos inspirar em uma jornada de transformação, crescimento e evolução psíquica. Ao longo da história, muitas culturas têm associado a morte a um ciclo natural de renovação. Desde as antigas civilizações até as crenças espirituais contemporâneas, a morte tem sido vista como uma passagem para outra dimensão ou como uma transformação de energia vital em algo novo

Avaliando esse contexto pela perspectiva psiquiátrica, o símbolo da morte pode ser uma ferramenta poderosa para a reflexão sobre a busca por renovação e crescimento. Não é raro nos defrontarmos com paciente que tocam nesse tema e falam de um impulso interno para o morrer. É claro que muitos transtornos mentais apresentam como sintomas e desfecho os pensamentos de morte e a ideação suicida, mas aprofundando esse desejo em uma análise psicodinâmica e como um movimento do inconsciente é possível acessar outras camadas.

Nesse sentido, quando um paciente nos diz sobre o desejo de morrer podemos nos fazer a seguinte pergunta: O que ele deseja matar dentro de si? O que é preciso morrer, transformar-se ou mudar dentro dele? O que não é mais suportável dentro dele que emerge como um impulso de autodestruição? Para muitos pacientes, a ideia de mudança pode ser assustadora, trazendo ansiedade e resistência. No entanto, ao compreender a morte como um símbolo de transformação, a resistência pode ser substituída por uma perspectiva de esperança e renovação.

Na mitologia, encontramos inúmeras histórias sobre heróis que enfrentam a morte simbólica ao longo de suas jornadas. Esses heróis são confrontados com a necessidade de abandonar seu velho eu, enfrentar seus medos e limitações, para então renascer em uma versão mais sábia e empoderada de si mesmos. Essas histórias são um espelho das nossas próprias experiências de vida, onde muitas vezes precisamos abandonar padrões negativos, crenças limitantes e comportamentos disfuncionais para podermos seguir.

Muitas vezes, no processo terapêutico, apresento aos pacientes uma situação hipotética no qual eles teriam duas escolhas: Na primeira ao apertar um botão conseguiria se livrar de toda dor, toda angústia e todo sofrimento e permaneceria vivo; na segunda ele simplesmente acabaria com a própria vida. Até o momento, em todos ao paciente que mantinham uma consciência de si mesmos, ninguém disse que apertaria o segundo botão. Acredito que isso fale sobre o impulso de vida e o mecanismo de autopreservação que existe em todos nós e que mostra, que na maioria das vezes, o desejo é de que algo extremamente doloroso morra dentro de nós. Acredito que não uma morte cruel, perversa e indiferente, mas essa morte de transformação, de mudança e de fluxo; como a metáfora da semente que morre para dar origem a uma planta ou do ciclo das estações, onde o inverno representa o período de morte e renascimento na primavera.

Acredito, que no processo terapêutico, é possível utilizar essa metáfora da morte e renascimento como uma forma de encorajar o paciente a explorar o que precisa ser deixado para trás em sua vida. Pode ser uma oportunidade para questionar hábitos prejudiciais, padrões de pensamento limitantes, relacionamentos tóxicos ou outros aspectos que estão impedindo seu crescimento pessoal. Além disso, o conceito de morte simbólica também pode ser aplicado em momentos de transições importantes da vida, como o término de um relacionamento, a perda de um emprego ou qualquer outra mudança significativa. Nesses momentos, é comum nos sentirmos perdidos e vulneráveis, mas também podemos perceber a oportunidade de nos reconstruir e ressignificar a nossa existência.

É importante ressaltar que, ao explorar o simbolismo da morte como uma ferramenta de reflexão, o terapeuta deve estar atento às particularidades e necessidades emocionais do paciente. Nem todos estarão preparados para essa abordagem, e alguns podem precisar de um suporte mais cuidadoso para lidar com a ideia de morte em qualquer contexto. O objetivo é sempre proporcionar uma perspectiva de esperança e crescimento, não aumentar o sofrimento ou desencadear questões não resolvidas.

Tenho buscado refletir sobre a morte como um símbolo de transformação e mudança e a partir disso encontrar significado nas nossas próprias experiências de vida. Não como uma idolatria da morte e nem como uma romantização da perda, mas buscando entender como as vezes um impulso tão grande de morte pode nos falar mais sobre a vida do que sobre o fim dela. Nessa perspectiva, essa abordagem pode ser uma fonte de inspiração para buscar a renovação pessoal, o crescimento emocional e a evolução psíquica. Enxergar o pensamento de morte como um movimento interno ou do inconsciente que busca abandonar aquilo que não nos serve mais e florescer em uma nova versão de nós mesmos pode ser um caminho poderoso no processo terapêutico.

Marcus Renato Castro Ribeiro